Estilo de Vida
Prazer e Sofrimento na Percepção do Trabalho Escravo Contemporâneo
Abaixo transcrevo outro resumo que comuniquei no II CBPCT, sobre como libertadores de escravos no Brasil contemporâneo representam socialmente o seu relevante trabalho. Foi tema do meu mestrado. Publicado originalmente
aqui.
PRAZER E SOFRIMENTO NA PERCEPÇÃO DO TRABALHO ESCRAVO CONTEMPORÂNEO
Jaqueline Gomes de Jesus
Introdução
No território brasileiro, as migrações que fornecem recursos humanos às organizações escravocratas são internas, restritas ao território nacional, englobando, principalmente, estados das regiões Nordeste e Norte do País (Figueira, 2001). Organismos nacionais e internacionais se articulam para combater a exploração do trabalho escravo. A partir das percepções dos respondentes sobre a organização do trabalho, vivências de prazer e vivências de sofrimento, analisadas através dos pressupostos teóricos da Psicodinâmica do Trabalho, foram investigadas, como parte de pesquisa de mestrado sobre as representações sociais do trabalho escravo no Brasil contemporâneo, as perspectivas profissionais e o campo representacional de pessoas que libertam escravos no Brasil contemporâneo.
Método
Foram aplicadas 10 entrevistas semi-estruturadas, formadas por questões abertas relacionadas à descrição do trabalho, sentimentos em relação a este, dificuldades encontradas, concepções e sentimentos relacionados à dinâmica profissional, a pessoas que trabalham como libertadores de escravos no Brasil contemporâneo. Os dados foram analisados por meio de análise de conteúdo (Bardin, 1995), baseada em análise categorial temática.
Resultados
Foram identificados 111 temas, organizados em nove categorias. A análise temática categorial das entrevistas indicou uma categoria-síntese para cada conjunto de três categorias: (1) organização do trabalho, (2) vivências de prazer e (3) vivências de sofrimento. A categoria-síntese Organização do trabalho foi estruturada em torno das categorias a) dinâmica do trabalho, b) impotência e c) sucesso. A categoria-síntese Vivência de sofrimento foi composta pelas categorias relativas a) à pessoa escravizada, b) à pessoa que escraviza e c) à sociedade onde se escraviza. A categoria-síntese Vivência de prazer foi organizada em categorias relacionadas a) ao liberto, b) ao libertador e c) à sociedade onde se liberta. Dos conteúdos expressos pelos libertadores, 51% se referiam à vivência de sofrimento; 34% à organização do trabalho e 15% à vivência de prazer.
Discussão
O escravagista e o escravo são socialmente representados pelo libertador com imagens menos positivas do que aquelas com as quais o libertador se representa. O valor atribuído à organização do trabalho dos libertadores é relacionado à eficácia do libertador na transformação das pessoas escravizadas em libertas. A dinâmica do trabalho requer profundo envolvimento intelectual e controle emocional para a devida consecução das metas. A vivência de prazer dos libertadores está relacionada, primeiramente, à auto-valorização de seu trabalho como libertador e à percepção de uma sociedade onde se liberta. A preponderância de vivências de sofrimento indica a forte aversão dos libertadores a toda a estrutura escravocrata.
Conclusão
A organização do trabalho do libertador depende da percepção que este tem acerca da organização do trabalho do liberto. O liberto tem um papel primordial não apenas na definição do cargo do libertador, mas também, e fortemente, na identidade profissional do libertador, e em como ele se percebe e percebe a sociedade brasileira. A expectativa de libertação do outro é importante para o trabalho do libertador, e a manutenção da saúde psíquica do libertador é influenciada pela percepção de uma sociedade libertária, de modo que o libertador lida melhor com seu sofrimento ao perceber que a sociedade viabiliza a liberdade de outros.
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