O Estudante, Esse Inimigo
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O Estudante, Esse Inimigo


Fonte da imagem: Hoje em Dia.

Um texto atual de Tristão de Athayde (Alceu Amoroso Lima):

O ESTUDANTE, ÊSSE INIMIGO
Tristão de Athayde
Publicado no Jornal do Brasil, de 10/02/1966.

Cada vez mais me convenço de que o maior êrro da Revolução de 1964 foi o seu divórcio com a mocidade e os trabalhadores. O estudante e o operário foram tratados como naturalmente subversivos, que precisavam provar preliminarmente o contrário para não incorrerem em medidas de precaução ou de repressão, em nome da “segurança nacional”. Não por culpa dêles, evidentemente, mas por culpa dos seus corruptores geralmente intelectuais ou professores, muitos dos quais mantidos até hoje sob cuidadosa vigilância... Ou apenas tolerados, como cobaias ou propaganda do liberalismo oficial.

É dos estudantes que desejo hoje falar, pois nêles depositamos, todos, as nossas esperanças. Não apenas por ser isso um lugar-comum e uma chapa invariàvelmente batida por todos os nossos discursos de paraninfos. Mas porque a política até agora seguida para com êles poderá ter resultados desastrosos.

O que se pretendeu, com essa política repressiva ou supressiva, foi evitar o extremismo esquerdista. O que vão conseguir, se tal política fôr mantida, para mal dos nossos pecados, não é a democratização da juventude, mas pelo contrário sua completa desdemocratização, por dois caminhos: ou o caminho do extremismo direitista; ou o caminho do sibaritismo dolce vita. Êste último ainda mais provável que o primeiro, já que a fascistização da mocidade ou a sua incorporação ao conservadorismo tradicionalista só atingirá minorias pràticamente inexpressivas. A não ser que vença a terceira revolução, isto é, a da linha dura, que aproveitaria, então, êsses pequenos núcleos como tropas de choque. Mas esta é uma hipótese bastante improvável.

O que vai conseguir, provàvelmente, essa política antiestudantil, se continuada, é a sibaritização da mocidade. Será o resultado mais patente da famigerada Lei 4.464. Essa lei procurou cercear a liberdade sindical dos estudantes e foi, recentemente, completada pelo fechamento da UNE e a proibição do seu funcionamento por seis meses. Daqui a seus meses... mas não prejulguemos. E tenhamos a esperança de que novos rumos surjam, em consequência dos bons elementos que incontestàvelmente foram agora colocados à testa dos negócios educativos. Trata-se de saber se terão mãos livres para agir.

A lei famigerada e paternalista procurou oficializar os diretórios estudantis, reduzindo-os pràticamente a meras associações decorativas, severamente controladas e sem nenhum interêsse para os estudantes. Sobretudo sem nenhuma possibilidade de treinarem para a sua futura vida pública, o que é uma das melhores justificativas da liberdade sindical estudantil.

Que acontece então com êsse dirigismo diretorial? Ou antes, que está acontecendo? É que os estudantes se desinteressam, totalmente, dêsses diretórios dirigidos e desfigurados, reduzidos a clubes dançantes e recreativos, que ficam em mãos de líderes mutilados ou de pelegos estudantis, tão nocivos como os pelegos operários. E por acaso vão eles interessar-se mais pelos estudos, porque deixam de se interessar pela política em geral, ou pela política universitária em particular? Não há nenhum indício de que assim o façam.

Os caxias continuarão a estudar direitinho, com diretórios ou sem êles. Quanto aos demais, e são sempre a maioria, tornam-se cada vez mais indiferentes, cépticos em relação à vida pública ou aos debates, preocupados apenas em cavar os seus diplomas o mais depressa possível ou então em gozar a boa vida, nas praias, nos botequins ou nos cabarés de luxo.

O peleguismo estudantil e o paternalismo oficial não conseguirão estudantes mais aplicados e sim estudantes sibaristas, indiferentes e prematuramente cépticos. Enquanto uma minoria silenciosa e de elite se lançará na clandestinidade e no extremismo esquerdista militante, preparando-se, então, guerrilheiramente para futuras batalhas, que esperamos em Deus sejam de Itararé, mas que podem, também, ser choques terríveis e sangrentos.

É a isso que nos levaria ou nos levará, na pior das hipóteses, uma política estudantil, para a qual o estudante universitário é um inimigo potencial...



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